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PUBLICAÇÕES/

"Desenhos, pinturas, palavras e cadernos delineiam o entrelace poético da primeira exposição conjunta de João Arthur Moroni e Giovana Gobbi. Trata-se de uma partilha de práticas que, embora distintas em materialidade e gesto, operam num território comum: a visualidade como extensão de um pensamento que se dobra sobre o cotidiano e sobre a elaboração de si. 

 

Nas obras de Moroni, é possível perceber a recorrência de signos que emergem do convívio com elementos ordinários e se reconfiguram em estruturas narrativas marcadas por percepção e deslocamento. Seu trabalho propõe uma arqueologia do olhar: um estranhamento meticuloso diante do espaço vivido, como quem tenta habitar o mundo a partir da construção imagética do próprio corpo. Essa autoimagem não se fixa, mas se projeta em camadas temporais e simbólicas como um autorretrato em contínua revisão. 

 

Gobbi, por sua vez, tensiona o espaço pictórico a partir de uma lógica de acúmulo e fragmentação. Sua pintura se constitui por gestos que lidam com o intervalo. Linhas, manchas, palavras e figuras se sobrepõem em uma superfície que resiste à hierarquia compositiva, instaurando um campo onde o fazer é também escuta. O cotidiano, nos trabalhos da artista, comparece como vestígio e como invenção: um campo de afetos que se inscrevem através de gestos visuais íntimos e performativos. 

 

Ambos os artistas compartilham uma concepção de processo criativo que escapa à linearidade. Seus trabalhos - embora formalmente resolvidos - mantêm algo do esboço, da anotação, do que ainda está por vir. Essa condição de rascunho não aponta para a incompletude, mas para a vitalidade de um fazer que não se pretende conclusivo. Há, aqui, uma poética da hesitação e da entrega, onde o rigor técnico se alia à experimentação e à escuta da memória. 

 

A exposição se dá, assim, como um campo de atravessamentos e reverberações. Os trabalhos funcionam como diários visuais, não no sentido confessional, mas como modos de organizar a experiência sensível do tempo, da imagem e da linguagem. Há, nesse conjunto, uma curadoria que aposta na coincidência como força operante: não como acaso puro, mas como aquilo que se repete com leve desvio, com diferença. 

 

Coincidência, aliás, que atravessa até o gesto inaugural desta mostra, nascida de uma conversa prolongada entre os dois artistas que, entre outras sobreposições, descobriram partilhar o mesmo dia de nascimento. Talvez seja isso que a exposição celebra: a coincidência como eixo poético do cotidiano, como campo fértil de sentidos que se entrelaçam e se transformam em presença. 

 

Como se tudo o que aqui se apresenta - cada linha, cada mancha, cada palavra - fosse o projeto de um projeto: um exercício de presença no banal, de atenção ao ínfimo, de escuta do que vibra no quase nada. Porque é nesse intervalo, entre o visível e o que escapa, que o existir se dá."

texto de

João Arthur Moroni 

VINTE E SEIS DE JANEIRO

Giovana Gobbi & João Arthur Moroni

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